Pandemia prejudica transplante de órgãos no Brasil
Foto: Divulgação/HFB
Levantamento divulgado hoje (5) pela Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO) revela os efeitos negativos que a pandemia teve tanto para pacientes já transplantados como para aqueles que se encontram na lista de espera.
De acordo com a entidade, as mais afetadas são as cerca de 80 mil pessoas que fizeram transplante de rim. Tendo por base dados os dois maiores centros de transplante renal do país, a ABTO chegou à conclusão de que aproximadamente 10% deles foram infectados pelo novo coronavírus, com taxas de mortalidade (proporção de mortes em relação ao total de transplantados) variando entre 2% e 2,5%.
Já a taxa de letalidade (proporção de mortes em relação aos transplantados diagnosticados) ficou entre 20% e 25%. A ABTO lembra que as taxas de mortalidade e letalidade da covid-19 na população geral do país encontram-se na faixa de 0,9% e 2,5%, respectivamente.
Segundo o integrante do Conselho Consultivo da ABTO Valter Duro, “o mais triste é que essas taxas continuarão crescendo, pelo menos durante o primeiro semestre de 2021, e somente serão estabilizadas com a vacinação em massa”.
Suspensão de transplantes
Ele acrescenta que, apesar de a queda nas taxas de doação e de transplante de órgãos com doador falecido não terem sido tão grandes como se temia, muitos dos transplantes eletivos (que não são urgentes) foram suspensos na maioria dos estados, devido às medidas de prevenção à contaminação pelo novo coronavírus.
Essa suspensão foi mais acentuada nos transplantes de córneas e rim com doador vivo. Nos casos de transplantes eletivos, a taxa de doadores efetivos, que era de 18,1 transplantes por milhão da população (pmp) em 2019, caiu 12,7%. Com isso, a projeção de ampliar esse número ultrapassar a marca de 20 pmp neste ano foi reduzida para 15,8 pmp, “ voltando ao patamar obtido em julho de 2017”, informa a ABTO.
Dados
Os transplantes renais apresentaram queda de 24,5% (17,2% nos transplantes com doador falecido e 59,6% nos com doador vivo). “A taxa de 22,9 transplantes renais pmp fez-nos retroceder 2,5 anos, voltando ao primeiro semestre de 2017. A queda na taxa de transplantes renais com doador falecido foi maior do que a queda na taxa de doadores efetivos, possivelmente relacionada à dificuldade de envio de rins não utilizados em alguns estados por restrições na malha aérea”, informou Valter Duro.
“É interessante observar que o número de transplantes renais com doador vivo [440] é o menor dos últimos 36 anos [em 1984 foram 495 transplantes renais com doador vivo]. Outro aspecto é a alta percentagem de transplante renal com doador vivo não parente e não cônjuge [9,7%]”, acrescentou.
Já os transplantes hepáticos (de fígado) apresentaram queda de 9%, sendo de 9% com doador falecido e de 13,2% com doador vivo. A ABTO acrescenta que a queda da taxa de transplantes hepáticos com doador falecido foi menor que a queda na taxa de doadores, refletindo aumento no aproveitamento do fígado. “Entretanto, o retrocesso na taxa de transplante hepático foi igual ao do transplante renal, retornando ao primeiro semestre de 2017”.
No caso da taxa de transplante cardíaco, a redução ficou em 16,7%. A taxa de 1,5 pmp é igual à obtida no primeiro semestre de 2014. Já a taxa de transplante de pulmão foi reduzida em 38,7% no país. O transplante de pâncreas diminuiu em 12,5%, retrocedendo ao nível registrado em 2018 (0,7 pmp). Segundo a ABTO o transplante de córnea apresentou uma redução de 52,7%. Com isso, a taxa obtida ficou em 33,9 pmp, valor equivalente ao obtido em meados dos anos 1990.
A pandemia afetou também os transplantes de medula, que apresentaram redução de 17,6%, sendo de 21,1% para o autólogo (que usa células tronco do próprio paciente), e de 13,3% para o alogênico (que usa células tronco de outra pessoa).
Lista de espera
O integrante da ABTO acrescenta que a lista de espera para transplante renal cresceu 5,8%, enquanto o ingresso em lista caiu 32%. “E a mortalidade em lista aumentou 33%, talvez em decorrência do maior risco de exposição ao covid, pela necessidade de realizar hemodiálise”.
A lista de espera para o transplante de córneas também cresceu. No caso, 38%, enquanto o ingresso em lista caiu 37%. “No [transplante de] fígado, por exemplo, o número de pacientes e a taxa de ingresso em lista de espera caíram 13% e 19%, respectivamente, e a mortalidade em lista aumentou 5%”, acrescenta Duro.